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sábado, 11 de fevereiro de 2012

Capítulo I - parte 2

A segunda parte do primeiro capítulo do livro que estou escrevendo, que na verdade é tudo que tenho escrito até agora. Talvez continui escrevendo, mas não sei se postarei aqui. É um caso a se pensar. Se eu não postar você poderá compar o livro, se algum dia ele for publicado.


CAPÍTULO I - Antes de tudo começar (parte 2)

Muitos na região acharam essa história trágica. Outros, porém, acharam mais trágico o que aconteceu com a irmã mais de Lílian. Seu nome, por uma falta de criatividade e excesso de breguiçe da parte dos pais, era Lívia Vládia. Apesar do parentesco, a dita cuja não era tão bonita quanto a irmã e demorou a arranjar um namorado. Ninguém a queria. Novamente houve mais um desses casamentos arranjados e por livre e espontânea pressão o infeliz teve de casar com Lívia.
A opinião geral era que eles formavam um belo casal, apesar de essa não ser a opinião do noivo. Mesmo assim, marcou-se a data, apesar da opinião do noivo, o que não é de surpreender, já que nunca ninguém pediu sua opinião. Só para constar, a sua opinião era que ele não queria casar e ele estava altamente infeliz com esta história. Também só para constar, a opinião de Lívia era que ela estava adorando se casar e que estava muito feliz com esta história.
Como o pai Basílio queria que o casamento saísse perfeito e, como era muito supersticioso, resolveu consultar um astrólogo para saber qual era o melhor dia e hora para sua filha casar. E então o casamento foi marcado para acontecer no dia e na hora indicados pelo astrólogo.
Acontece que naquela época estava em moda o uso de relógios d’água como objetos decorativos e, eventualmente, para saber as horas. Isso era considerado um estilo um tanto barroco pelos mais modernos que acreditavam que relógios de pêndulo eram muito melhores. De fato, os relógios de pêndulo eram maravilhosos, pois os fundamentos matemáticos do seu princípio de funcionamento envolviam o que havia de melhor em matemática da época.
O fato é que pessoas comuns não entendiam mesmo o princípio de funcionamento e usavam o relógio apenas para saber as horas o que, de fato, não é uma surpresa, visto que esta era sua função. Tais pessoas esquecem, porém, que um matemático passou dias desenvolvendo e tentando entender a complexa matemática por traz disto. Muitos não compreendiam por que usar tanta matemática para simplesmente saber as horas. Talvez por isso o uso de relógios d’água estivesse voltando à moda, dada a sua simplicidade de funcionamento.
O fato é que havia um desses na casa de seu Basílio. Bem no quintal. Coincidentemente, era exatamente no quintal, sob a copa das árvores, que ocorreria o casamento de sua filha. Esta, por sinal, já estava bastante nervosa e impaciente por ter de esperar até a hora marcada. Tanto que foi inúmeras vezes até o relógio d’água verificar se faltava muito para o momento solene. Acontece que, sem que ela percebesse, uma das pérolas do seu colar caiu dentro do relógio e tapou o orifício por onde escorria a água impedindo seu fluxo.
Ninguém percebeu isso (pelo menos não a tempo). E ninguém percebeu que a hora determinada havia passado. Todos já estavam impacientes. O noivo, que só queria um motivo para acabar com a cerimônia, perdeu a paciência, disse umas verdades na cara do ex-sogro e fugiu num cavalo branco com a madrinha do casamento.
Lívia ficou arrasada e sua mãe mais ainda porque tinha gasto uma grana preta com vestido de casamento e os violinistas vindos do Norte especialmente para a cerimônia. O pai também estava muito irritado e ficou mais ainda quando os violinistas cobraram pelo serviço. Basílio recusou-se a pagar, mas os violinistas mostram um contrato assinado pelo próprio Basílio no qual ele se comprometia a pagar pelo serviço absurdamente caro sob pena de perder sua casa. Basílio, é claro, não se lembrava disso, pois estava um pouco bêbado na ocasião, mas não houve escapatória e teve de pagar a conta. Naquele tempo já existia agiotagem.
Mas o fato é que Lívia estava realmente deprimida e com razão. A moça já não mais comia e passava o dia inteiro trancada no quarto lendo poesia quinhentista, o que é deplorável, já que tal estilo poético já estava fora de moda. Depois desse acontecimento a moça ainda ganhou fama de “encalhada” o que se somou a outros apelidos já consagrados, tais como “sem sal”, “magrela”, “raquítica”, “sonsa”, “cabelo de pixaim” e por aí vai. A voz corrente era que ela jamais arrumaria um marido.
Basílio, vendo que a filha estava realmente triste e temendo que ela jamais arrumasse um marido resolveu fazer alguma coisa para alegrá-la e imortalizá-la. Pensou em duas coisas: escrever um livro de matemática e por como título o nome da filha; ou escrever um livro de sonetos e por como título o nome da filha. Percebendo que realmente não tinha muito talento pra matemática e querendo mostrar ao mundo o seu (suposto) talento como poeta, Basílio optou pela segunda opção.
O livro de poemas (sonetos, para ser mais preciso) “Lívia Vládia” causou grande repercussão. A crítica, no geral, meteu o pau e não mediu palavras para expressar a sua opinião sobre a coisa. A consagrada Sociedade dos Poetas Vivos também não viu o livro com bons olhos, apesar do comentário de um de seus membros dizendo que o livro “era o futuro da arte poética” e coisas assim. O presidente da sociedade expulsou o tal membro e rasgou a página quatorze do “Lívia Vládia”.
Apesar da repercussão inicial não muito boa, anos depois a crítica passou a ver aquela obra com outros olhos e começaram a desconfiar que realmente pudesse haver boa poesia naquele livro. De fato, “Lívia Vládia” tornou-se sucesso na rodas de poetas e Basílio foi considerado um gênio e sua obra um marco na história da literatura. Infelizmente, para ele, a fama veio muito tarde, na verde veio depois de sua morte. Mas o fato é que ele ficou famoso e imortalizou o nome de sua filha.
Esta por sua vez, casou anos depois do fatídico evento, com um tal de J. Pinto Fernandes, que nem tinha aparecido na história.
O fato é que seu Basílio não foi o único da família que ficou famoso por seus feitos. Na verdade, seu neto Leonardo ficou muito mais conhecido naquela região por seus feitos e aventuras. Este livro é a sua história. Por isso vamos deixar de enrolação e começar a falar logo dele.

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