Pensamento da semana

"But we're never gonna survive, unless we get a little crazy"

Seal - Crazy
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domingo, 26 de fevereiro de 2012

Capítulo II - parte 1

Não sei por que ainda estou postando esses trechos do livro que estou escrevendo. Deveria ser segredo editorial, mas enfim, na falta do que postar, vai isso mesmo.
Essa é a primeira parte do segundo capítulo. Novamente, críticas serão bem vindas, mas não necessariamente acatadas.

CAPÍTULO II - Ainda antes de tudo começar


Quando Manoel abandonou sua mulher e seus três filhos toda a cidade comentou o fato. Dizia-se que ele conheceu uma vadia do Leste e fugiu com ela para aquelas bandas levando parte das jóias da família e duas garrafas de um caríssimo vinho produzido nas melhores terras do Norte. Nunca mais foi visto, mesmo quando Leonardo peregrinou pelo Leste, mas isso é outra história.
Nessa época Leonardo tinha sete anos. Tinha duas irmãs: Ana Maria, dois anos mais nova que Leonardo, e a caçula Maria Madalena de apenas um ano. Depois de uma semana chorando por causa da safadeza do ex-marido, Lílian percebeu que seria mãe solteira e o peso da criação dos filhos cairia todo sobre ela e então ela passou mais uma semana chorando por causa disso. A criação dos filhos, porém, não seria problema, pois a família estava disposta a ajudar e a família era dona de um terço da cidade.
Quero dizer, na verdade, a criação dos filhos é sempre um problema. O que podemos mensurar é o quão problemático é o problema. Filósofos e pensadores dedicaram parte de suas vidas tentando achar a melhor maneira de criar um filho de modo que ele tenha uma boa educação e os pais tenham uma boa saúde mental. Após muitos debates chegou-se a duas conclusões. Primeira, não existe essa melhor forma. Segunda, quando seu filho der algum trabalho, amarre ele num toco ao meio-dia e dê-lhe dez chibatadas com pimba de boi. Filósofos garantem que ele dificilmente voltará a se danar.
 Leonardo cresceu ao lado das irmãs e dos primos. Estavam acostumados a brincar juntos, subir em árvores juntos, correr pelados pela rua juntos, quebrar as coisas juntos, apanhar juntos e por aí vai. Eram realmente gente de boa saúde e muita energia. E Leonardo era de longe o mais esperto de todos.
Houve uma vez, por exemplo, em que ele, acidentalmente, diga-se de passagem, pôs fogo no piano de cauda do avô Basílio. Este quando soube do ocorrido ficou vermelho de ira, mas estava racional o suficiente para pensar qual seria o melhor castigo para o neto. Depois de muito pensar ele concluiu que uma tradicional pisa de cinto e um dia inteiro sem comer não seriam suficientes, mas já era alguma coisa.
Quando foram procurar o garoto perceberam que o mesmo tinha uma habilidade enorme para se esconder. De fato, Leonardo sempre ganhava no pique - esconde, mas seus esconderijos já estavam ficando manjados. Procuraram nesses lugares e nada. Era evidente que ele não estava lá, pois ele era muito esperto é não seria ingênuo o suficiente para se esconder lá. Acabou que procuraram por ele a tarde inteira e ninguém o acho. Alguns teriam dito que ele foi abduzido, mas como a crença em seres extraterrestres ainda havia sido incrustada no imaginário popular, isso não faz sentido nenhum.
Assim, a raiva inicial causada pela destruição do piano transformou-se em preocupação generalizada causada pelo sumiço do garoto. Leonardo não voltou para casa para o jantar. Muito menos estava em sua cama na hora de dormir ou na hora de acordar no dia seguinte. Mas estava à mesa na hora do café-da-manhã saboreando um delicioso bolo de milho. Sua mãe quase não acreditou quando ele entrou pela porta da frente, sentou a mesa, cortou uma fatia de bolo e começou a comer. Com a maior naturalidade do mundo. E a maior cara de pau também.
 - Esse bolo tá bom. Tô com muita fome – foi o que ele respondeu a alguma pergunta que sua mãe fez, pergunta essa cuja resposta não deveria ser a resposta que Leonardo deu.
Vou lhes dizer onde Leonardo esteve. Sabendo que sua travessura não sairia barato, ele resolveu que deveria se esconder. De preferência num esconderijo muito bom, onde ninguém pudesse lhe encontrar. Após um minuto de reflexão lhe ocorreu que este lugar poderia ser dentro do que sobrou do piano queimado, que agora estava jogado no quintal da casa do avô. E foi exatamente para lá que ele foi munido apenas com um saco de azeitonas. E lá passou a tarde e a noite. E como havia previsto, ninguém teve a idéia de procurá-lo lá. Quando a fome apertou e ele refletiu um pouco e concluiu que a raiva inicial já deveria ter se transformado em preocupação, e então ele voltou para casa.
Poderia falar mais sobre isso, mas acho que já está enchendo o saco.

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